segunda-feira, 23 de junho de 2014

Grave!



Desenganem-se os que pensam que este é um texto feito apenas para bater nos mesmos de sempre. Os que lá estão.

Quem jogou futebol sabe de antemão que jogos perfeitos contam-se pelos dedos de uma mão e que para que uma equipa mantenha sempre a mesma bitola de qualidade e tenha condições de vencer todos os jogos, é necessário um tempo de preparação e entrosamento que nem sempre existe no caso das selecções Europeias.

No caso específico de Portugal, o que se torna grave não é o facto de a equipa estar desgastada e haver jogadores com índices físicos bem abaixo do requerido para um campeonato do mundo com estas condições climatéricas, nem sequer as más decisões técnicas dos jogadores nos jogos, nem as más decisões tácticas de quem os lidera neste aspecto.

O que se torna grave é a forma leve e dolosa como se encara tudo o que se tem passado em volta da nossa selecção nos últimos anos, mesmo na era Felipão, e depois se espera destes jogadores e desta equipa técnica façanhas tamanhas e maravilhas exibicionais, ou que joguem sempre como todos jogaram no jogo do "play-off" contra a Suécia.

Ninguém pode culpar um treinador por escolher os 23 de sempre pois essa táctica resultou com Scolari da forma como todos sabemos e só não está a resultar com Paulo Bento por causa das péssimas condições físicas em que metade desta equipa chega a este campeonato do mundo.

Culpa do trabalho de preparação de um mês? Não creio. Creio até que a decisão de estagiar nos "States" foi a mais acertada dado o desgaste físico que todos (repito todos) os jogadores de Portugal apresentam.

Mas adiante ao que interessa.

Anda por aí uma série de iluminados, cumentadeiros ou paineleiros, que julgam que neste "El Cagado" mundo que é o nosso futebol existe uma panóplia de jogadores que poderia ser escolhida por Paulo Bento para fazer melhor figura do que estes. Essa base larga de jogadores seleccionáveis não existe. Uma ou duas opções no máximo poderiam ter sido diferentes, mas de resto não existem outras opções válidas para este tipo de competição.

É fácil apontar hoje o dedo a quem ontem, especialmente na 2.ª parte, deu continuidade à terrível exibição efectuada contra a Alemanha. A meu ver existem factos que nos envergonham mais do que uma simples derrota contra a equipa da "Gorda" ou um empate contra os "camones" treinados por um Alemão. O que nos envergonha não tem a ver com prestações desportivas, mas sim com questões de organização e estrutura do nosso futebol que nos levam a estar hoje quase no mesmo ponto em que estávamos há 30 anos quando falhávamos continuamente todas as qualificações de todas as fases finais destas competições. Ou seja, éramos de forma sustentada piores que os outros.

Para mim, grave é esperamos maravilhas de uma selecção com notória falta de sentido de equipa, apesar dos inegáveis valores futebolísticos de alguns dos seus elementos, e não nos questionarmos sobre quem como e porquê nos coloca nesta situação.

O fenómeno de asfixia do futebol de formação, e consequentemente do jogador jovem Português, tem vindo a ser cimentado ao longo de mais de 20 anos (Riade já foi há 25 anos), onde tanto a Federação Portuguesa de Futebol (essa que é a responsável pelo futebol amador em Portugal) e os principais clubes das Ligas Profissionais de Futebol em Portugal, abandonaram o futebol de formação ou dos escalões inferiores das competições nacionais como fonte primordial para o municiamento das suas equipas principais.

Hoje os nossos dirigentes assistem embevecidos, a um assassinato do futebol na província provocado pelo mais aberrante sistema de competições que há memória a nível do futebol europeu, com uma segunda liga que só serve para as grandes equipas rodarem os estrangeiros que não cabem no seu plantel principal, em conjunto com alguns jovens que nunca irão  ter oportunidade de pisar o relvado com os elementos dos plantéis principais. Se seguirmos por aí abaixo verificamos ainda a existência de uma "série de séries" competitivas com regras e regulamentos intrincados, que servem apenas para criar condições a "determinadas equipas", para se manterem sempre no desce e sobe à 2.ª Liga, enquanto outras definham no pântano das competições distritais ou no inenarrável método organizativo do aberrante Campeonato Nacional de Seniores.

E depois temos a política de mercado. Nada melhor para disfarçar a falta de condições humanas e de coragem para apostar no jogador nacional do que a desculpa do mercado. Se outros contratam estrangeiros para as suas equipas de juniores, nós também temos de o fazer. Se os outros tem equipas B cheias de pequenas estrelas de um qualquer país da América Latina ou da África Austral, nós em Portugal também temos de ter. Isto tudo servindo sempre os interesses dos tubarões do futebol, que tem hoje mais influência junto das equipas e das selecções que os próprios treinadores, chegando ao cúmulo de contornar protocolos ou até ditar mudanças comportamentais nos seus representados quando algo não lhes corre de feição.

O Português tem esta tendência mórbida de pegar em tudo pela rama. De suspirar pelos bons tempos sem se preocupar em fazer o trabalho de fundo para que esses bons tempos venham. Não acho que seja uma característica do nosso povo. Foi um hábito que se adquiriu ao longo dos tempos e que hoje se encontra espelhado em quase todas as facetas da nossa cultura. Só assim se explica que se tenham criado expectativas exageradas ao redor desta equipa nacional e que tenhamos nós mesmos pensado, mais uma vez, que somos melhores do que os outros, mesmo que claramente os outros trabalhem mais e melhor que nós em todos os aspectos.

E olhem que a mim não me custa nada afirmar que nestas condições Portugal arrisca-se a entrar num outro período negro da sua história futebolística ao nível das competições de selecções. Faço-o hoje após mais uma lição de trabalho que nos foi proporcionada por uma equipa com menos talento do que a nossa, e nas vésperas de um jogo contra uma equipa que nos vai dar água pela barba (Meireles já cortavas esse ninho de ratos não?), num jogo onde mais uma vez não conta só a nossa vitória mas sim os números pela qual ela tem de ser conseguida.

Triste sina? Não. Falta de visão. Falta de coragem para mudar. Falta de lucidez para limpar de vez as estruturas directivas do nosso futebol dos "filhos da fruta" que as corrompem.

Ficam para as história as "selfies". Dos políticos, dos jogadores, dos jogadores com os políticos. Ao menos estas sempre me fizeram sorrir.

Grave meus amigos. Grave...

PS1: A escolha da imagem que acompanha este texto é tudo menos inocente. As declarações da pessoa em causa quando comparadas com aquelas que hoje vem nas edições dos nossos diários, emitidas pelo mesmo jogador, demonstram bem o saco de gatos que está a representar Portugal no Brasil. Isto tudo com a bênção e o beneplácito dos ilustres do nosso futebol...

PS2: Sou só eu que acho que anda por aí muita gente histérica na nossa comunicação social? E bipolares então é aos pontapés.

5 comentários:

  1. Caríssimo Nunomaf:

    Após cuidada leitura do teu texto, entendo que eriges dois problemas para a falta de sucesso da selecção de futebol de Portugal, sendo que o primeiro reside na estrutura da Federação - concordo inteiramente contigo nesse ponto - e o segundo na falta de aposta em jogadores nacionais por parte de clubes portugueses - aqui a minha opinião divide-se da tua!

    Uma vez que, quanto a Federação, comungamos da mesma preocupação, não estarei a adiantar mais argumentos aos que já enunciaste!

    No que concerne aos clubes, penso que a questão é muito mais complexa, mas no fim de contas, entendo que devemos ter um política desportiva comum nacional. Uma vez que os clubes pretendem equipas cada vez mais competitivas, ambiciosas, e de sucesso imediato, estas preferem mil vezes gastar mais dinheiro em jogadores devidamente formados, com potencial para futuros negócios lucrativos onde comem todos. E aqui, muitos preferem o jogador estrangeiro - a razão é que a qualidade não é exclusiva de um só país, mas sim de todos, e muitas vezes nos países mais improváveis encontram-se jogadores de enorme talento. Embrenhados no sistema de gestão escolhido - encontrar barato, potenciar e vender - os clubes vão sobrevivendo à base dessa política. Se dá resultado para alguns, penso que não podemos os censurar!

    Contudo, se pretendermos salvar o futuro do futebol em Portugal, então aí o sistema de gestão dos clubes, bem como a politica a prosseguir tem que mudar, e os três grandes, em conjunto com a Federação, têm que tomar medidas para criar uma base de jogadores nacionais capazes de serem escolhidos para a selecção.

    Uma das ideias que entendo serem positivas para salvaguardar o futuro do futuro de Portugal, passa pela retirada das equipas B da 2º Liga, e incluí-las num campeonato de sub-23, composto por dez equipas, a jogarem entre si a 3 voltas, e com play-off final entre as quatro equipas mais bem classificadas. Cada equipa só pode ter dois jogadores estrangeiros, com idade inferior ou igual a 23 anos. Este campeonato permitiria aos nossos jovens valores continuarem a desenvolver-se, de forma plena, sendo que os melhores jogadores poderão, ao atingir os 23 anos e findo, o campeonato sub-23, serem integrados num draft para serem distribuídos pelas equipas da primeira liga.

    É claro que esta ideia levanta muitos mais problemas, que não vou abordar aqui, mas se não existir a discussão necessária, então é que o futebol português não sai do marasmo tão bem elucidado por ti, caríssimo Nunomaf!

    Espero que o presente texto represente a pedrada no charco necessária para se debater o futuro do futebol português!

    Um abraço e continuação de um excelente dia!

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  2. Não achei que as nossas ideias divirjam em qualquer que seja o ponto enunciado. Quanto muito complementam-se pois também comungo das opiniões no comentário.

    Mas continuo a achar que a resolução do problema, do lado dos clubes, é uma questão de coragem em imporem limites a essa política de mercado ou mercantilista que comungam.

    Certo que esta política do compra e vende resulta quando dotados dos técnicos certos e de uma estratégia de médio ou curto prazo (há jogadores que jogam uma época em Portugal e logo de imediato saem para outros clubes), mas no longo prazo tal método de subsistência ou sobrevivência torna-se perniciosamente prejudicial para o jogador jovem Português.

    Não convém também esquecer que grande parte da formação de carácter de um jogador jovem ocorre precisamente nas épocas em que se encontram sistematicamente tapados por esses tais estrangeiros "com valor", logo impossibilitando-os de serem criados dentro da cultura dos clubes ou de uma estrutura competitiva sólida que lhes permitam depois serem úteis nas nossas selecções.

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  3. Caro NunoMaf primeiramente parabens para um excelente post que ja muito nao tinha tido o prazer de ler gostei imensamente como gostei do coments do Menino Rebelde e como dizes se coadunam perfeitamente pois o problema do futebol Portugues ai esta explicado de uma forma simples e esclarecedora,acrescento que jogadores como Figos Rui Costas,Joao pintos e entre outros acabou esta geracao que temos agora e fraquinha tirando o Ronaldo poucos se salvam,nunca me entusiasmei com esta seleccao e facil de dize-lo agora porque as coisas estao a correr mal e a vista de todos depois de tomar conhecimento do grupo em que caimos pensei logo estamos tramados,a Alemanha sabemos como sao nao brincam as seleccoes o USA desprezamos sempre mas esquecemos que eles sao uma equipa de guerreiros nunca viram a cara a luta e quase sempre nunca nos safamos com eles o Gana e fortissimo,e agora a estupides do dia o FCP e o grande responsavel pelo enfraquecimento da nossa sel;eccao juntamente com o Benfica claro quanto a Academia de Alcoshit e o que estamos vendo a selecao nao joga uma mda sorry guys um abraco desde op Canada.

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  4. Johnny Rook23/06/14, 19:50

    Muito boa radiografia, bem como o diagnóstico.

    Não tenhas problemas em afirmá-lo claramente: Portugal nos próximos 20 a 25 anos não volta a por os pés em Mundiais e Europeus.

    Vai-nos acontecer o que aconteceu à Hungria dos anos 50 e à Bélgica dos anos 70 e 80 (notem que só agora voltou aos grandes palcos) que depois dos anos de ouro, o filão acabou e nunca mais foram a lado algum.

    O futebol português (e dos países como Portugal) teve azar em dois aspetos: o acórdão Bosman e a criação e proliferação dessa figura nojenta e sinistra chamada empresário. Ainda por cima, como chicos espertos que somos, temos tido o azar de ter empresários (primeiro o Veiga e agora o Mendes) que dominam, direta e indirectamente, o futebol europeu e fazem o que querem e lhes apetece.
    O poderio financeiro destes gajos é tal que além dos clubes e federações até as uefas e fifas eles conseguem influenciar, já para não falar nas casas de apostas. Esta é uma actividade que, para o bem do futebol, devia ser irradicada.

    Depois de tudo isto o projecto Queirós que tantos frutos deu e que os fdp da FPF logo quiseram acabar com ele assim que poderam. São centenas de jovens futebolistas portugueses deitados fora, desaproveitados, impossibilitados de jogar futebol profissional de alto nível.

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  5. Um texto fabuloso do amigo nunomaf, com o qual concordo na íntegra. Enquanto os clubes não darem oportunidade aos jovens a fim de jogarem nas equipas principais não vamos a lado nenhum
    Tudo o que se disser de contrário é puro floclore e jogo de interesses de dirigentes e empresários.

    Enfim, é o futebolzinho que temos...

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